A arquitetura é uma das expressões mais notáveis da cultura de um povo. Através dela, refletem-se os costumes, os anseios e as características dos habitantes. No Nordeste brasileiro, essa identidade foi profundamente moldada pela influência da colonização portuguesa, das construções vernaculares e do barroco, adaptada estrategicamente ao clima da região. No entanto, nos últimos tempos, observa-se uma crescente descaracterização da paisagem arquitetônica local, resultado de um processo de modernização que, frequentemente, ignora a riqueza estética, histórica e funcional da arquitetura tradicional.
Quando adaptada às condições do Nordeste, a arquitetura colonial e vernacular deu origem a construções que não apenas embelezavam as cidades com suas cores e formas diversas, mas também atendiam de forma inteligente às necessidades climáticas e sociais da região. Elementos como paredes de cobogós, telhados de telhas de barro, alpendres amplos e janelas com venezianas são exemplos de soluções arquitetônicas massivamente utilizadas, que promoviam conforto térmico, reduzindo o consumo e a necessidade de energia elétrica — num território historicamente marcado pela escassez de recursos, isso era crucial. Hoje em dia, em face do avanço das temperaturas e das catástrofes ambientais, ideias como essas passam a ser reconsideradas por quem pensa em construir e morar com qualidade e respeito ao meio em que habita.
Todavia, esse modelo arquitetônico tradicional que, para nós, nordestinos, remete à sensação de pertencimento e afeto, vem sendo substituído por construções de aspecto frio, padronizadas em cores, formas, texturas e acabamentos, geralmente inspiradas em modelos urbanos de países estrangeiros, muito presentes nas construções do Sudeste do país. Fachadas de vidro, formas chapadas e retilíneas, grandes estruturas de concreto e ausência de sombreamento natural são cada vez mais comuns entre as novas edificações, sejam elas residenciais, comerciais ou corporativas, mesmo em áreas interioranas. Essa uniformização compromete não somente a harmonia estética das cidades, mas também ignora as características ambientais e culturais de um povo, tratando com indiferença suas particularidades. Esse apagamento resulta em cidades cada vez mais parecidas entre si.
A adoção indiscriminada de uma forma “globalizada” de construir e morar revela uma visão equivocada de progresso, que desvaloriza o patrimônio histórico e ignora alternativas sustentáveis baseadas no saber local. Essa substituição desenfreada da arquitetura tradicional por modelos genéricos contribui para o enfraquecimento da identidade coletiva e para a perda de um importante elemento da memória social: o de casa com cara de lar, revelando a identidade dos que a habitam.
É de suma importância questionar as práticas arquitetônicas no Brasil. Valorizar o tradicional não significa resistir à modernidade, mas, sim, construir de maneira mais consciente, respeitando a história, o clima e a cultura de cada lugar. A preservação da essência arquitetônica regional deve ser um pilar do desenvolvimento sustentável e da afirmação da identidade cultural brasileira, marcada por sua pluralidade e riqueza.
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